Prezado(a)s amigo(a)s e investidore(a)s,
Como em setembro, o mercado de juros americano continuou dominando a dinâmica de preços dos demais ativos. Ao longo de outubro, a taxa de 10 anos testou o patamar simbólico de 5%, onde os títulos encontraram, como imaginávamos, novos compradores. No mês completo, a alta de 35pb contribuiu para derrubar os preços de títulos de renda fixa e ações em boa parte do mundo.
A alta acumulada nos juros de mercado, segue minando as perspectivas para a atividade global nos próximos meses. As falas mais recentes de membros do FOMC seguiram essa direção, reconhecendo que o aperto de condições financeiras provavelmente tira a necessidade de altas adicionais nos juros de política monetária. O mercado de opções, precifica pouco mais de 25% de probabilidade de uma nova alta de 25pb nos Fed Funds até o final do ano.
Com o mercado reconhecendo que, ao menos nos EUA, os juros continuarão altos até a inflação apontar para 2% (pouco provável nos próximos doze meses, ainda sob efeito de inflação de moradia alta e mercado de trabalho aquecido) ou a atividade econômica ameaçar seriamente o mandato secundário do Fed de preservar o pleno emprego, vemos uma probabilidade cada vez menor do ciclo atual terminar em um “pouso suave”. Como estamos observando no Brasil e no Chile, acreditamos que a combinação de desaceleração da inflação e da atividade levará a uma normalização parcial dos juros, para patamares ainda restritivos, mas significativamente abaixo das máximas de décadas atingidas recentemente.
Apesar da guerra entre Hamas e Israel e seus potenciais efeitos disruptivos no Oriente Médio, o petróleo terminou o mês em queda de mais de 7%. Isso indica que, o mercado não acredita em uma expansão do conflito ou aumentou a probabilidade implícita de uma recessão que reduziria substancialmente a demanda. Também deve ter colaborado para essa reação a posição da Arábia Saudita, o grande produtor marginal, apoiando tacitamente a aliança EUA-Israel. Pode ser mais um caso de miopia dos mercados, concentrado nos efeitos de curto prazo e de primeira ordem, mas, por ora, parece mais razoável apostar na moderação racional das grandes potências militares do que na “marcha da insensatez” de Barbara Tuchman.
Nos mercados locais, a tranquilidade no mercado de câmbio (talvez ajudada pela perspectiva mais concreta de estímulo à atividade na China) e nos últimos dados de inflação nos levou a manter o cenário de queda nos juros básicos até 9%. Nos últimos dias do mês, a discussão de mudança na meta fiscal para 2024 liderada pelo Presidente levou, pela primeira vez em vários meses, a um descolamento dos prêmios de risco embutidos nos juros locais com relação a outros emergentes. Essa instabilidade deve prosseguir até que se tenha uma ideia mais clara da versão final do orçamento do próximo ano, entre novembro e o início de dezembro.
O abandono da meta zero para o resultado primário era, na nossa visão, uma questão de poucos meses (ainda que parecia mais provável que isso só ocorreria em 2024). Não acreditamos, porém, em uma desancoragem fiscal que ponha em risco nosso cenário-base de queda da taxa Selic e de crescimento do PIB. O risco fiscal deve seguir latente durante o mandato presidencial atual, mas episódios de crise devem aparecer somente quando a atividade desacelerar mais fortemente ou quando se aproximarem as eleições de 2026, em ambos os casos com pressão por aumentos de gastos mais substanciais.
Obrigado,
Luciano Sobral, economista-chefe da Neo.
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