Prezado(a)s amigo(a)s e investidore(a)s,
Os dados da economia americana referentes a janeiro, alimentaram uma dinâmica nos mercados, familiar para quem os acompanhou no ano passado. A combinação de uma série de dados de atividade fortes (começando pela criação de mais de 500 mil vagas de emprego no mês, pelo relatório do BLS), com inflação persistentemente alta, levou o mercado a considerar que o nível de juros ao final do ciclo atual voltou a ficar em aberto. A precificação do mercado futuro para os Fed Funds no final de 2023 passou a 5,3% (de 4,8% no início do mês), e a perspectiva de juros mais altos por mais tempo, fez com que o dólar voltasse a se valorizar fortemente contra praticamente todas as moedas que acompanhamos (o peso mexicano é a notável exceção).
Apesar desses dados, ainda vemos os indicadores antecedentes de inflação e atividade americanas, apontando para uma forte desaceleração ao longo deste ano. Além disso, dificuldades com ajustes sazonais parecem estar aumentando o nível de ruído entre meses, de forma que, mais dados ainda se fazem necessários para que consideremos mudar nosso cenário (seguimos trabalhando com juros americanos ao redor de 5% no final do ciclo, compatíveis, a nosso ver, com uma inflação anual caindo para cerca de 3%).
No Brasil, pouco foi feito para dissipar as incertezas quanto à condução da política econômica, ampliadas em janeiro. Uma “trégua” na relação entre Banco Central e Executivo foi acenada, mas deve durar pouco, já que cortar juros no curto prazo parece incompatível com as projeções e o mandato do BC, enquanto o governo vai seguir demandando medidas de estímulo ao crescimento. Expectativas de inflação pelo Focus seguem em alta, na direção do que o mercado acredita que vá ser uma meta revisada, e a inflação implícita nas taxas de mercado para prazos mais longos embute o maior prêmio de risco desde os últimos meses do governo Dilma.
Assumindo uma alteração de meta de inflação para 4% e expectativas de mercado acomodando-se 0,5pp acima desse patamar, acreditamos ainda haver espaço para cortes na taxa Selic este ano, até um patamar mais alto do que seria caso a meta fosse mantida (trabalhamos com taxa terminal a 10%). Também por aqui, indicadores antecedentes (commodities, preços no atacado) seguem apontado queda na inflação de bens, e a inflação de serviços segue desacelerando por conta da política monetária apertada, e do enfraquecimento incipiente no mercado de trabalho.
O calendário de março, está repleto de eventos com potencial de mexer com os mercados: além de novos dados mensais de atividade e inflação nos EUA, com importância inflada pelo que mencionamos, devemos ter, no Brasil, mais detalhes sobre o novo arcabouço fiscal. Neste tópico, entre a falta de disposição para cortar despesas, e a inviabilidade política de aumentar impostos, vemos risco das projeções para a trajetória de dívida no médio prazo embutirem premissas pouco realistas de crescimento futuro, o que, provavelmente, alimentaria uma reação negativa nos juros. A relação do governo Lula III com o mercado ainda está longe de ser pacificada, para prejuízo do país
Obrigado,
Luciano Sobral, economista-chefe da Neo.
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