Prezado(a)s amigo(a)s e investidore(a)s,
Março foi um mês de baixa volatilidade e bom desempenho dos ativos de risco globais, o que ressaltou a deriva negativa dos ativos brasileiros. Apesar da pouca oscilação, o real segue acumulando depreciação, enquanto outros emergentes com juros altos (notadamente México e Colômbia) viram suas moedas ganharem entre 2% e 3% contra o dólar no período. Os juros reais longos voltaram a 5,8%, mesmo patamar de quando as Treasuries de 10 anos (que hoje operam a 4,25%) testaram 5%, no final de outubro passado. Por fim, o Ibovespa segue entre os piores índices de ações no mundo, enquanto vários mercados atingem ou renovam máximas históricas.
2024 não tem sido bom para preços dois dos principais produtos da nossa pauta de exportação, soja e minério de ferro – sobretudo este, que acumulou queda de 18% em março e quase 30% desde o início do ano. Isso pode ajudar a explicar parte das desvalorizações do real e da bolsa, mas outras duas evoluções ligadas ao cenário doméstico são mais preocupantes para o futuro.
O Banco Central sinalizou de forma mais enfática que o ciclo de cortes na Selic pode estar se aproximando de uma pausa ou moderação. No cenário central, de inflação abaixo de 4% este ano e entre 3% e 3,5% em 2025, nossa projeção de Selic a 9% no final do ciclo ainda é perfeitamente realizável. Porém, as indicações recentes de uma inflação de serviços que dificilmente baixa de 5% anuais e de um mercado de trabalho forte, com alta sustentada de salários reais, fazem com que quaisquer projeções de inflação partam de um nível alto, de onde surpresas em preços de bens podem inviabilizar quedas mais fortes nos juros. Novamente, não é o nosso cenário-base, mas este vem tornando-se mais questionável nos últimos meses.
O crônico ruído político/fiscal deve completar qualquer explicação desse mau desempenho dos ativos brasileiros. Aqui, chama a atenção a constante inventividade para dificultar o cumprimento das metas fiscais, desde novos descontos a pagamentos das dívidas dos estados a piores perspectivas de distribuição dos lucros de estatais. Essa piora da percepção geral sobre a política econômica tem ocorrido mesmo em um ambiente em que o crescimento do PIB é relativamente saudável (seguimos esperando 2% este ano, em meio a um cenário para renda e consumo melhor que em 2023) e ainda distante das eleições de 2026.
Talvez seja possível resumir e correlacionar o volume de ruído com a popularidade do governo, num contexto em que qualquer queda nesta variável será percebida como passível de ser “resolvida” com mais ideias de políticas públicas que trocam alguma melhora no curto prazo por incerteza e instabilidade depois do ciclo eleitoral. Outros fatores que poderiam impulsionar preços de ativos terão que, ainda por bastante tempo, lutar contra os incentivos ruins derivados da economia política da polarização.
Luciano Sobral, economista-chefe da Neo.
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